Por RODRIGO AQUINO
Professor, pesquisador e consultor técnico-científico em clubes de futebol; e membro do LabSport, CEFD/UFES, Vitória/ES, Brasil.
Em 2003, um grupo de pesquisadores dinamarqueses, liderado pelo Prof. Dr. Peter Krustrup, iniciou um programa de promoção da saúde e tratamento de doenças por meio da prática do futebol com finalidades clínicas. Esse programa foi rapidamente impulsionado por veículos de divulgação midiáticos e científicos. Os resultados são animadores!
A partir de 2010, vários ensaios clínicos randomizados (um tipo robusto de pesquisa científica) foram conduzidos utilizando o treinamento de futebol em grupos de pacientes com hipertensão, diabetes tipo 2, osteopenia e câncer de próstata e mama; muitas doenças destas associadas com o processo de envelhecimento com morbidades e pobre estilo de vida. O conjunto de pesquisas leva a concluir que o futebol é um tipo de treinamento completo e versátil para a população em geral, combinando estímulos físicos para desenvolvimento das capacidades motoras básicas (ex.: resistência, velocidade, força e coordenação motora), psicológicas (ex.: melhora do estado de humor e redução do estresse), técnica-táticas (ex.: habilidades e maior capacidade de tomada de decisão) e sociais (ex.: cooperação, companheirismo e socialização), entre outros aspectos (Figura 1).
Figura 1. Modelo holístico dos benefícios da prática do futebol para promoção da saúde e tratamento de doenças (Adaptado de Krustrup & Krustrup, 2018).
Além disso, as evidências suportam que a prática sistematizada do futebol realizada 2-3 vezes por semana, com aproximadamente 1 hora de duração em cada dia, é suficiente para promover efeitos positivos e simultâneos em marcadores de aptidão cardiovascular, metabólicos e musculoesqueléticos. Especificamente, os estudos revelaram um aumento no consumo máximo de oxigênio de 3,5 ml/kg/min em 12–26 semanas de treinamento, bem como uma perda de 1,7 kg de massa gorda e 1,1 kg de aumento de massa muscular em 12–16 semanas para adultos sedentários, juntamente com uma queda na pressão arterial sistólica e diastólica em 12–16 semanas para pacientes de 30 a 75 anos com hipertensão leve a moderada, além de ser utilizado como estratégia de reabilitação para uma ampla gama de grupos de pacientes.
O uso do futebol como uma terapia pode promover uma enorme implicação global, por ser uma prática barata e com alta possibilidade de acesso ao redor do mundo. Estima-se que existem cerca de 500 milhões de praticantes de futebol em todo o mundo, dos quais cerca de 200 milhões não estão vinculados a clubes. Além disso, a prática do futebol pode ser mais atrativa por ser uma atividade motivadora, lúdica e social.
Contudo, é importante entendermos que a prática do futebol que nos referimos não é aquela que estamos habituados a assistir em competições nacionais e internacionais na TV. Devemos adaptar a estrutura do jogo e as regras, para promover a participação de todos e todas. Por exemplo, é recomendado utilizar formatos de jogo com equipes compostas por 2 a 5 pessoas (2 vs. 2 até 5 vs. 5). Além disso, também podemos inserir algumas regras, como: “não correr com ou sem bola”, “sem contato físico”, “a bola deve ser sempre jogada abaixo da altura média da cintura dos/as praticantes”, e reduzir a área de prática. Estas adaptações são sugeridas para encorajar a participação ao longo da vida de todos/as e resulta em poucas lesões ortopédicas e eventuais distúrbios cardiovasculares em comparação com o tipo de jogo de futebol tradicional e com caráter de competição e praticado por atletas de elite.
Portanto, é hora de popularizarmos a prática do futebol no Brasil para promoção da saúde e tratamento de doenças!
Sugestão de leitura:
Krustrup, P., & Krustrup, B. R. (2018). Football is medicine: it is time for patients to play! British Journal of Sports Medicine, 52(22), 1412-1414.