Neste artigo mencionamos a relação que o poder socioeconômico tem com os níveis de atividade física e como o nível de pobreza pode ser devastador no que tange aos cuidados em saúde e a possibilidade de inclusão/oportunidades de prática de atividade física, que é um “ponto chave” para o processo de envelhecimento saudável na perspectiva do “envelhecimento ativo” da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Esta relação entre poder socioeconômico/pobreza vs. nível de atividade física é feita sob a ótica dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela Organização das Nações Unidades (ONU) dentro da agenda 2030. Antes de entrar no assunto é importante relembrar os 17 objetivos desta agenda e sua aplicação. A prática de atividade física pode ser uma ferramenta importante para alcançar vários dos ODS. Promover a atividade física pode melhorar a saúde e o bem-estar, promover a igualdade de gênero, reduzir as emissões de gases de efeito estufa e melhorar a qualidade de vida nas cidades.
Os ODS são um conjunto de 17 metas globais adotados pela Assembleia Geral da ONU em 2015. Os ODS visam acabar com a pobreza, proteger o planeta e garantir a paz e a prosperidade para todos até 2030. Cada objetivo tem metas e indicadores específicos que são projetados para avaliar o progresso para o alcance das metas. Os ODS são um norte para países e organizações alinharem seus esforços em direção ao desenvolvimento sustentável e visam garantir que ninguém seja deixado para trás na busca por um futuro mais sustentável, saudável e feliz.
Os 17 ODS são:
1 – Erradicação da pobreza: acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares.
2 – Fome zero e agricultura sustentável: acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.
3 – Saúde e bem-estar: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades.
4 – Educação de qualidade: assegurar a educação inclusiva, e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
5 – Igualdade de gênero: alcançar a igualdade de gênero e emponderar todas as mulheres e meninas.
6 – Água limpa e saneamento: garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos.
7 – Energia limpa e acessível: garantir acesso à energia barata, confiável, sustentável e renovável para todos.
8 – Trabalho decente e crescimento econômico: promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos.
9 – Inovação infraestrutura: construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação.
10 – Redução das desigualdades: reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles.
11 – Cidades e comunidades sustentáveis: tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
12 – Consumo e produção responsáveis: assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis.
13 – Ação contra a mudança global do clima: tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos.
14 – Vida na água: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares, e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
15 – Vida terrestre: proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da Terra e deter a perda da biodiversidade.
16 – Paz, justiça e instituições eficazes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.
17 – Parcerias e meios de implementação: fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.
Posto o cenário, vamos elucidar um pouco da relação entre nível pobreza vs. nível de atividade física.
Sem dúvida a pobreza é uma barreira importante para a prática de atividade física. Lembrando que a OMS define atividade física como qualquer movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos que requer gasto de energia. A atividade física refere-se a todos os movimentos, incluindo o tempo de lazer, de transporte (ir e voltar de lugares) ou parte do trabalho de uma pessoa.
A pobreza pode ser entendida de várias maneiras, incluindo a carência real de acesso à bens e serviços essenciais, como alimentação, vestuário, alojamento e cuidados de saúde (o que inclui a oportunidade de prática de atividade física), que são necessários para atender às necessidades básicas da vida cotidiana. Essa é uma forma de medir a pobreza e é comumente referida como pobreza absoluta. No entanto, a pobreza também pode ser entendida em termos relativos, comparando o nível de renda ou recursos de um indivíduo ou grupo com o restante da sociedade. Além disso, a pobreza também pode ser entendida em termos de privação social, que inclui a falta de acesso a oportunidades educacionais, emprego decente, serviços de saúde e outros serviços básicos, bem como a exclusão social e a discriminação. A pobreza tem relação com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que é um índice estatístico que leva em consideração expectativa de vida, educação (média de anos de escolaridade completados e anos esperados de escolaridade ao entrar no sistema educacional) e indicadores de renda per capita. Um país obtém um nível mais alto de IDH quando a expectativa de vida, o nível de educação e a renda nacional bruta per capita são mais altas.
As pesquisas têm demonstrado que pessoas de nível socioeconômico mais baixo tendem a praticar menos atividade física do que pessoas de nível socioeconômico mais alto. Isso pode ser devido a uma série de fatores, como falta de acesso a instalações esportivas e de lazer, menor disponibilidade de tempo livre, falta de incentivo ou motivação e falta de recursos financeiros para pagar por atividades físicas. Além disso, a atividade física muitas vezes é vista como um luxo em comunidades de baixa renda, onde as prioridades são frequentemente voltadas para a sobrevivência e a estabilidade/sobrevivência financeira. Para ajudar a resolver esse problema, é importante que políticas públicas e programas de saúde sejam desenvolvidos para fornecer acesso a atividades físicas seguras, inclusivas e socialmente acessíveis. A conscientização sobre a importância da prática de atividade física também deve ser promovida, para incentivar as pessoas a adotar um estilo de vida mais ativo e saudável, independentemente de sua situação socioeconômica.
No entanto, ser pobre demais e viver em um bairro com alto nível de violência é uma barreira para uma caminhada saudável e segura. Como ir e voltar para casa em segurança? Os níveis de atividade física estão fortemente relacionados à desigualdade de renda dentro de um país e entre países de renda alta e média. As desigualdades econômicas podem contribuir para a pandemia global de inatividade física e ser um fator importante a ser considerado para atingir a meta da OMS de redução da inatividade física bem como todos os seus efeitos nefastos no aumento de morbidades e mortalidade no curso do processo de envelhecimento.
Evidências mostram que a inatividade física aumenta o risco de várias doenças. Estima-se que a inatividade física, em todo o mundo, seja responsável por 6% das doenças coronárias, 7% do diabetes tipo 2 e 10% do câncer de mama e cólon. No total, a inatividade física causaria 9% das mortes prematuras globalmente. Como a inatividade física está associada a essa gama de doenças crônicas, ela também provoca sérios problemas econômicos. Uma estimativa conservadora, mostra que a inatividade física custou aos sistemas de saúde internacionais US$ 53,8 bilhões de dólares americanos em todo o mundo em 2013.
Os seguintes fatores podem desencorajar as pessoas a se tornarem mais ativas: urbanização, tráfego de alta densidade; baixa qualidade do ar e poluição; medo da violência e do crime; e falta de parques, calçadas e instalações esportivas/recreativas. Por outro lado, o que pode tornar as pessoas, de baixa renda, mais ativas é a oferta de aulas gratuitas de atividade física em praças, praias, piscinas públicas e parques e os programas nos quais o usuário mais assíduo ganhe prêmios com base no número de visitas.
Um ponto importante a destacar é que a falta de acesso a transporte e meios de locomoção pode impactar negativamente nos níveis de atividade física, especialmente de pessoas de baixa renda que não têm recursos financeiros para comprar ou manter um meio de transporte particular. Sem meios de transporte, essas pessoas podem ter dificuldades para chegar a locais onde podem praticar atividades físicas, como parques, instalações esportivas e academias. Isso pode levar à falta de oportunidades para praticar atividades físicas no lazer e, consequentemente, a um estilo de vida mais sedentário.
A falta de transporte também pode afetar a atividade física diária, como caminhar ou andar de bicicleta para o trabalho ou escola. Sem essas opções de transporte, as pessoas podem ser forçadas a depender de transporte público ou de carros de terceiros, o que pode ser caro ou inconveniente. Isso pode levar a escolhas menos saudáveis, como usar o carro em vez de caminhar ou andar de bicicleta, o que pode levar a uma vida com hábitos mais sedentários e a um maior risco de doenças crônicas relacionadas ao estilo de vida. Para combater esses desafios, é importante que as políticas públicas e os programas de saúde trabalhem para fornecer transporte seguro e acessível para locais onde as pessoas possam praticar atividades físicas. Isso pode incluir a criação de rotas de ônibus que atendam a locais de atividades físicas, a oferta de bicicletas públicas e a criação de áreas para pedestres e ciclistas seguras. Além disso, é importante que as comunidades locais incentivem o uso de transporte ativo, como caminhar e andar de bicicleta, por meio de campanhas de conscientização e incentivos financeiros.
Outro fator interessante é que a atividade física regular é extremamente importante para prevenir o ganho de peso e a obesidade, bem como para melhorar a saúde geral e reduzir o risco de várias doenças crônicas. No que tange ao gênero, no entanto, é verdade que mulheres em desvantagem socioeconômica enfrentam maiores barreiras para a prática regular de atividade física. Muitos fatores podem contribuir para isso, incluindo falta de acesso a instalações esportivas e de lazer, falta de tempo livre devido a obrigações familiares ou de trabalho, falta de transporte seguro para chegar a instalações de atividade física e falta de conhecimento sobre a importância da atividade física e como incorporá-la à rotina diária. Além disso, as mulheres em desvantagem socioeconômica também podem enfrentar estereótipos de gênero e normas culturais que desencorajam a participação em atividades físicas. Por exemplo, podem ser vistas como “masculinas” ou “não-femininas” se participarem de esportes ou exercícios físicos vigorosos. Para combater esses desafios, é importante que as políticas públicas e os programas de promoção da saúde sejam adaptados às necessidades e circunstâncias das mulheres em desvantagem socioeconômica. Isso pode incluir a criação de programas de atividade física acessíveis e culturalmente relevantes, o fornecimento de transporte seguro para instalações esportivas e o envolvimento da comunidade na promoção da atividade física. Também é importante destacar que pequenas mudanças na rotina diária, como caminhar mais, subir escadas em vez de usar o elevador ou fazer pausas para se movimentar durante o trabalho, podem ter um impacto significativo na saúde e na prevenção do ganho de peso.
A atividade física está diretamente relacionada a vários dos ODS, incluindo:
Saúde e bem-estar (ODS 3): A atividade física é uma das melhores maneiras de manter a saúde e o bem-estar. Ela pode ajudar a prevenir doenças crônicas, como doenças cardíacas, derrame, diabetes tipo 2 e obesidade, e pode melhorar a saúde mental e reduzir o estresse.
Cidades e comunidades sustentáveis (ODS 11): A atividade física pode ajudar a promover o transporte ativo, como caminhar ou andar de bicicleta, em vez de usar carros ou outros meios de transporte que emitem poluentes. Isso pode ajudar a reduzir a poluição do ar e melhorar a qualidade de vida nas cidades.
Combate às mudanças climáticas (ODS 13): A atividade física pode ajudar a reduzir as emissões de gases de efeito estufa, pois pode ser uma forma de transporte mais sustentável e também pode reduzir a necessidade de energia para aquecimento ou resfriamento.
Igualdade de gênero (ODS 5): A atividade física pode ajudar a promover a igualdade de gênero, incentivando meninas e mulheres a participarem de atividades físicas e esportivas e promovendo a inclusão de pessoas de diferentes origens e identidades de gênero.
Educação de qualidade (ODS 4): A atividade física pode ajudar a melhorar a educação de qualidade, pois está comprovado que a atividade física ajuda a melhorar o desempenho acadêmico e a concentração.
Fontes:
https://www.physio-pedia.com/Physical_Activity_in_Low_and_Middle_Income_Countries
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28645058/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33768390/